Poucos times têm tantas conquistas no futebol brasileiro nos últimos
anos como Inter e São Paulo. De 2005 para cá, somados, eles abocanharam
três Libertadores, dois Mundiais, três Brasileirões, duas Recopas e uma
Copa Sul-Americana. A rivalidade, é claro, acirrou os ânimos entre
dirigentes e torcedores. O Caso Oscar é apenas mais um elemento na briga
entre os dois gigantes.
Da narração de Pedro Ernesto Denardin, na final da Libertadores de
2006, no Morumbi, quando ele gritou a plenos pulmões que Rafael Sobis
com seus dois gols havia "rasgado a camisa do São Paulo e pisado nela", à
guerra nos tribunais entre os dois clubes e Oscar para saber a quem
pertence os direitos do jogador, qualquer questão envolvendo tricolores e
colorados parece transformar-se em Gre-Nal. No Brasileirão do ano
passado, por exemplo, uma pequena vingança paulista. O São Paulo goleou o
Inter no Beira-Rio e derrubou o técnico Paulo Roberto Falcão e o vice
de futebol Roberto Siegmann.
O Morumbi, aliás, foi a fonte de inspiração para que o Inter passasse
a ter uma gestão mais agressiva no futebol e, por consequência, desse
início a cinco temporadas consecutivas com conquistas relevantes.
— O São Paulo sempre foi um modelo de gestão, de como cuidar das
categorias de base e do clube como um todo. O Inter sempre observou os
passos do São Paulo e, muitas vezes, sim, copiou o São Paulo — contou o
ex-presidente do Inter Fernando Carvalho.
João Paulo Jesus Lopes, vice de futebol do São Paulo, admite que as
disputas entre colorados e tricolores vem aumentando nas recentes
temporadas. Nega-se a pronunciar a palavra "rivalidade" para tratar das
duas instituições, mas admite as rusgas por interesses comuns.
— Entendo que o Inter esteja sofrendo nesse momento por não poder
utilizar o Oscar. Isso é porque o futebol é paixão e, por vezes, acirra
os ânimos, mas o alinhamento entre Inter e São Paulo é muito grande.
Temos o Inter como um clube de estrutura invejável — destaca Jesus
Lopes.
A seguir, Zero Hora recupera algumas histórias de uma rivalidade
recente, mas que tem levado os dois clubes a frequentes discussões
públicas e acusações de parte a parte.
Como Oscar chegou ao Inter
Em 2009, durante uma reunião do Clube dos 13, o representante do São
Paulo no encontro, Ataíde Gil Guerreiro, teria dito ao então presidente
do Inter, Vitorio Piffero: "Temos um menino, uma joia em nossa base, que
está em litígio com o clube. Teremos de vendê-lo, pois não queremos que
ele vá para o Corinthians". A "joia" era Oscar, e o São Paulo já tinha
um apontamento de que ele deixaria o Morumbi por meio da Justiça.
O
clube também tinha informações de que ele havia sido oferecido ao
Corinthians. Temendo ver o meia no Parque São Jorge, o dirigente teria
feito a oferta a Piffero. A versão é contada por Fernando Carvalho. O
São Paulo não confirma. Meses depois, Oscar obteve a liberação judicial
para deixar o time paulista. Foi contratado pelo Inter, sem custos.
— Sempre soubemos que tratava-se de uma contratação de risco. Mas,
por se tratar de um fora de série, valia o investimento — disse
Carvalho.
Em fevereiro, São Paulo reverteu o jogo na Justiça do Trabalho e
desde então voltou a ter os direitos sobre o meia. Dentro de um mês, o
processo deverá voltar ao TST, em Brasília. A tendência é que Oscar seja
liberado para atuar pelo Inter, enquanto o processo sobre quem é o
detentor dos direitos seguirá. Caso Oscar e Inter tenham sucesso nos
tribunais, pagarão uma multa a ser determinada pela Justiça para que
ele, enfim, possa ser jogador colorado. Se o São Paulo vencer, porém,
Oscar custará o que o Morumbi quiser para vendê-lo. O certo é que o
Inter vai encarar o Fluminense, nas oitavas de final da Libertadores,
sem Oscar.
— O Caso Oscar não estragou a relação entre os dois clubes. Ambos têm
interesses legítimos. O São Paulo em momento algum criou dificuldades
para o Inter desde que o Oscar está em Porto Alegre. Mas, agora,
trata-se de um interesse maior da instituição com relação ao jogador —
afirmou Jesus Lopes.
O Caso Lima
O São Paulo já era bicampeão Mundial quando encarou o Inter nas
oitavas de final da Copa do Brasil de 1996. O confronto durou apenas uma
partida: 1 a 1 no Beira-Rio — com gols do atacante Leandro Machado para
o Inter e do zagueiro Bordon para o São Paulo. Mas o jogo da volta não
ocorreu, porque o volante Lima (que depois fez carreira na Roma e no
Lecce) havia disputado a fase preliminar da Copa do Brasil pelo
Nacional, do Amazonas. Um erro infantil, que não combinava com a
grandeza dos paulistas. Ao STJD, o São Paulo alegou que não houve má-fé
na inscrição irregular. Não adiantou. O Tribunal limou a equipe da Copa
do Brasil. O Inter seguiu adiante, mas caiu para o Flamengo, já nas
quartas.
O "gato" de Sandro Hiroshi
Lembram do Sandro Hiroshi? Na péssima campanha do Inter em 1999, que
culminou com a manutenção do clube na Série A graças a um gol de Dunga
sobre o Palmeiras de Felipão na última rodada, o nissei colaborou com a
salvação colorada. Denunciado por ter adulterado o documento de
identidade, Hiroshi foi descoberto como "gato", e fez o São Paulo perder
alguns pontos no Brasileirão.
O Botafogo havia sido derrotado pelo São Paulo e ingressou no STJD.
No tapetão, ganhou os três pontos. Depois, o Inter fez o mesmo. Havia
empatado em 2 a 2 com o São Paulo no Morumbi, mas, graças a uma o STJD,
obteve mais um pontinho. Por que um ponto apenas? Porque, no
entendimento do Tribunal, o São Paulo teria revertido para o adversário
os pontos ganhos com Hiroshi em campo. Assim, os cariocas receberam três
e o Inter, apenas um.
O retorno de Ricardo Oliveira
Não foram apenas os gols de Rafael Sobis, no Morumbi, nem a fala de
Rogério Ceni, no Beira-Rio, que construíram a primeira Libertadores do
Inter. Houve também um duelo nos bastidores. Ricardo Oliveira era o
principal atacante do São Paulo para aquela final.
No jogo de ida, a derrota por 2 a 1 para o Inter, ele pouco fez, mas
era a esperança para a tentativa de virada no Beira-Rio. Mas o
empréstimo do atacante junto ao Bétis encerrava-se entre o mata-mata
decisivo _ porque a Libertadores estendeu-se até agosto, devido à Copa
da Alemanha.
O São Paulo, então, amarrou com o Bétis a seguinte situação:
renovaria o empréstimo de Oliveira por mais seis meses, mas, ao final do
primeiro mês, haveria a rescisão de contrato, e o seu retorno à Espanha
para a temporada 2006/2007. A direção do Palmeiras denunciou a manobra e
comunicou que isso poderia conter alguma irregularidade perante à Fifa _
podendo culminar com a suspensão do atacante até o fim do ano.
Dos gabinetes do Beira-Rio, um fax foi enviado e caiu diretamente na
mesa de José León, presidente do Bétis, com informações sobre a possível
sanção. Temendo uma punição, León chamou Oliveira de volta. O Inter
atingiu a maioridade com um dramático 2 a 2.
Miranda interceptado no aeroporto
Perder a Libertadores no Beira-Rio mais a "questão Ricardo Oliveira"
mexeu com o São Paulo. E com Muricy Ramalho. O troco viria logo após a
Libertadores, e em forma de zagueiro. Miranda havia sido contratado pelo
Inter, a fim de substituir Bolívar, então vendido ao Mônaco. Deixou
Souchaux, na França, onde atuava, rumo a Curitiba, sua cidade natal.
Depois, voaria para Porto Alegre e assinaria com o Inter. O lance é
cinematográfico e verídico. Ao desembarcar em Guarulhos, a fim de pegar a
conexão para o aeroporto Afonso Pena, o empresário Juan Figer e uma
comitiva de dirigentes são-paulinos aguardava o zagueiro. Miranda não
pegou o voo para Porto Alegre e, em dezembro, sagrava-se campeão
brasileiro com o São Paulo. Índio e Fabiano Eller formaram a zaga
colorada no Mundial.
A sedução de Guiñazu
Certo ou errado, o fato é que o Morumbi faz valer o seu poder de
império, de clube que seduz jogadores com a oportunidade de títulos e
bons salários, para reforçar o time. Foi assim em 2009, quando por pouco
não tirou Guiñazu do Inter. Mesmo com contrato em vigor, o volante
recebeu a oferta de R$ 1 milhão de luvas mais salários de R$ 250 mil.
O volante argentino estava com a cabeça no Morumbi. Chegou a pegar o
elevador, ingressou na sala da direção e pediu para ir. Recebeu um
incisivo "não". Permaneceu no Beira-Rio, seguiu dedicando-se em campo e,
mais tarde, acabou ampliando o seu contrato até 2014. Entre as duas
direções, acusações mútuas de "pirataria", e mais um capítulo nas rusgas
entre colorados e tricolores.
A janela antecipada
Outra Libertadores, outro Inter e São Paulo valendo a Copa. Sim,
porque quem passasse na semifinal enfrentaria o Chivas na decisão e já
poderia encomendar as faixas — o que realmente aconteceu. Mas, até a
chegada à semifinal, muita coisa aconteceu entre Inter e São Paulo e os
bastidores da CBF e até mesmo em elegantes gabinetes suíços da Fifa.
Ocorreu que Fernando Carvalho descobriu uma brecha no regulamento da
Conmebol que permitia a inscrição de 28 jogadores em vez de os
tradicionais 25 atletas. O São Paulo reclamou. Mais: era ano de Copa,
assim, havia uma pequena chance de a Fifa aceitar a antecipação da
janela de agosto e permitir até três inscrições para a semifinal da
Libertadores.
O Inter foi à Fifa para garantir as vagas de Tinga, Renan e Rafael
Sobis — que na verdade pouco contribuíram no mata-mata contra os
paulistas. Conseguiu e provocou a ira do Morumbi. No final, o Inter, que
trocou Fossati por Roth, eliminou uma vez mais o São Paulo, avançou à
final, e conquistou o bicampeonato.
Fernandão, o pacificador por Dagoberto
Antigo sonho colorado, Dagoberto já vestia vermelho e branco em
outubro. Ao menos em pensamento. Foi naquele mês que ele e o Inter
acertaram-se. O contrato com o São Paulo chegaria somente ao fim em maio
de 2012, mas o jogador já considerava-se atleta do Inter. O problema: o
São Paulo não havia sido comunicado. E o Inter precisava do atacante já
para a pré-Libertadores, em janeiro.
Após trocas de farpas mútuas, Fernandão acabou escalado como
pacificador. Jogador do São Paulo nas temporadas 2010 e 2011, o capitão
do Mundial de 2006 pelo Inter intermediou as negociações para a
liberação antecipada de Dagoberto. O Inter desembolsou R$ 1,4 milhão
para contar com o atacante cinco meses antes de o seu contrato com o
Morumbi chegar ao fim.